quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Mais um?


Planeta morto, planeta posto.


Depois de ler esta noticia aqui fiquei a saber que pode, afinal, vir a descobrir-se mais um planeta no nosso sistema Solar... se vier a verificar-se, gostava de saber como ficaria a minha carta astrológica.

Há por aí algum astrólogo que queira comentar estas descobertas dos Astrónomos ?...

Qual será a influencia do Planeta X no meu signo (balança) ? estou mortinho de curiosidade para saber se afinal muda alguma coisa...


PS: Viva o Japão!

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Uma resposta crítica e um elogio merecido.

Recentemente li, pela primeira vez, uma tentativa de análise metódica e racional à velha questão tão em voga actualmente se a religião tem mais efeitos positivos ou negativos nas sociedades. Existem até alguns artigos sociológicos com resultados interessantes (nomeadamente respeitante à relação entre religiosidade vs confiança e religiosidade vs cooperação). Mas neste caso o texto que me merece atenção chama-se “Existe correlação entre religiosidade e uma sociedade melhor?” e foi a convite do próprio autor que visitei o portal ateu onde o estudo foi publicado. Este sítio introduz essa análise como sendo um “imenso privilégio (…) apresentar este magnifico trabalho de Octávio Mateus”. Não duvido que tenham um imenso privilégio ao apresentar um trabalho de Octávio Mateus mas o que contesto é que seja um “magnífico trabalho”. Contesto-o não por causa da autoria do texto, mas pelo seu conteúdo. Para ser sincero a autoria pouca relevância tem quando se fala de Ciência (note-se que foi nesta secção que o portal ateu decidiu colocar o trabalho em causa). Se é Ciência, pouco importa que Octávio Mateus seja apresentado como “Doutorado em Paleontologia (…) paleontólogo na Universidade Nova de Lisboa (…) estuda dinossauros e evolução de répteis Mesozóicos…” nem que seja “…co-autor do Livro Evolução e Criacionismo: uma relação impossível” . Nem é relevante sequer ter sido ele meu orientador de Trabalho de Fim de Curso, algo que muito orgulho me dá. Muito menos é relevante termos já publicado em conjunto, assim como não é importante quem eu sou nem o que faço. Em Ciência conta o que se diz não quem o diz. É curioso encontrar este tipo de apresentação no portal ateu, precisamente onde ninguém deveria aceitar o velho argumento da autoridade que deixou Aristóteles com a Razão tempo demais. O maior respeito que podemos demonstrar pelos nossos mestres é pensarmos sobre o que eles disseram e expormos as nossas conclusões. Esta é também uma das maiores qualidades que reconheço a quase todos os meus amigos ateus.

Sobre este ponto permitam-me contar uma breve história que se passou comigo recorrentemente ao longo da universidade. Nada tem que ver com este caso mas reflecte bem o que sinto perante a troca de ideias...

Sempre tive por hábito questionar os meus colegas aquando das suas apresentações de trabalhos e era meu costume incentivá-los a fazerem o mesmo sobre os meus trabalhos. Nunca me revi na posição de muitos deles que achavam ofensivo e ameaçador colocar perguntas e criticar o trabalho dos colegas, já que, isso seria “tramar os outros” e o importante era “passar”. O importante era vencer o sistema e ser doutor.

Dubitando ad veritatem pervenimus disse Cícero no século primeiro antes de Cristo. E como tinha razão!? É duvidando que alcançamos a verdade. Sempre julguei que uma universidade servia para tentarmos alcançar a verdade e não para conseguirmos ser doutor.
Sirvo a verdade não me sirvo dela.
Por isso mesmo lutarei sempre contra o querer vencer a favor do querer saber. Porque vencer sem saber é não saber por que se venceu, enquanto que quem sabe nunca deixa de vencer. Não saber por que se venceu é pequena vitória sem triunfo nem proveito, mas ao conhecer, ainda que perdendo, é maior vitória porque se aprendeu mais.

É assim que a Ciência funciona e é por isso que não posso deixar de prestar esta homenagem ao meu amigo e mestre Octávio Mateus pensado sobre o que ele escreveu.

Comecemos então pela introdução onde escreve o autor:

“Discutimos (…) se a sociedade é melhor por ser mais religiosa ou menos religiosa. (…) Contudo interessa saber, de forma objectiva e pragmática, se a religiosidade/ateísmo traz benefícios ou malefícios à sociedade. Eu também tenho a minha opinião, mas abstenho-me de a transmitir pois é fundamentada em dados não mensuráveis. (…) somos poucos os que usamos dados objectivos, estatísticos e pragmáticos para suportarmos a nossa convicção política. A situação é quase semelhante com a religiosidade.”

Importa dizer que este trabalho tem o mérito de não se limitar a ser uma crónica de opinião (como o texto que agora lêem) e apresentar dados concretos de uma forma “objectiva”, “pragmática” e por escrito de forma a poderem ser rebatidos. Não discordo da objectividade e o pragmatismo do texto, o que contesto é que esteja correcto.
Logo no início aquilo que mais salta à vista é a dificuldade que existe em definir os termos usados ao longo da análise, o próprio autor o diz:

“Procuro fazer uma análise estatística que meça a correlação da ‘religiosidade’ ou do ‘ateísmo’ com a ‘bondade’ ou ‘aspectos positivos da sociedade’, mas isto traz imediatamente dificuldades: como medir a religiosidade ou ateísmo, bondade ou maldade, positivo ou negativo? Alguns destes conceitos são altamente subjectivos e são raros os dados concretos sobre eles. E como medir tais conceitos em pessoas ou em sociedades? Por uma questão de praticabilidade, escolhi a análise de país a país, pois existem dados estatísticos disponíveis.”

Aqui o critério usado foi a praticabilidade (ser prático) e aproveito apenas para dizer que lá por ser prático não quer dizer que esteja correcto. Aliás muitas vezes o que é prático não está nada certo. Tantas são as vezes em que ao querermos resolver um problema que acabamos por chegar a resoluções não verdadeiras que me vou escusar a dar exemplos. Mais digo, antes de ser prático tem de ser válido, até por que se não for válido nem pratico é. Presumo que a praticabilidade foi também utilizada como critério para se escolherem os índices utilizados. Julgo que neste caso estamos perante uma simplificação não válida e logo impraticável se quisermos medir a “ bondade”, “maldade”, “positivo” e “negativo” através dos índices escolhidos. Aposto que a Alemanha Nazi do final dos anos trinta do século passado tinha os melhores índices de, “Desenvolvimento Humano”, “Produção científica”, “PIB per capita”, “Mortalidade Infantil”, “Taxa de Alfabetização” e “Homicídios”de toda a sua História senão mesmo de todo o mundo. E parece-me evidente que lá por nunca ter estado tão desenvolvida segundo esses índices e tão à frente de todo o mundo nessa altura, daí não se pode tirar que era uma sociedade onde reinava a “bondade” e que era a melhor em qualquer um dos outros “aspectos positivos de uma sociedade”. Ou pode?

Outro termo utilizado e que parece distorcer ainda mais a análise é a definição de “irreligiosidade/ateísmo”. Se incluímos no mesmo saco: ateísmo, agnosticismo, deísmo, cepticismo, livre pensamento, humanismo secular, secularismo geral e heresia, agruparmos alhos com bugalhos com formigueiros e com porta-aviões só por nenhum conter elefantes no seu interior. Não estamos a agrupar todos os ateus mas sim uma confusão de correntes de pensamento que nada tem em comum a não ser não pertencerem a nenhuma religião em concreto. Note-se que muitas destas pessoas até podem ser influenciadas pelas religiões seguindo a maioria dos seus princípios. Repito, apenas não professam nenhuma religião em particular, apenas isso. Nada nos diz se as religiões influenciaram os comportamentos destas pessoas e de que forma isso se reflecte nos seus países. Permitam-me ainda dizer que os ateus militantes que critiquei no meu post ficam numa minoria, muito restrita, se definirmos “irreligiosidade/ateísmo” desta forma. O próprio autor acrescenta outro comentário ao escrever “não analiso o tipo e qualidade de religião, apenas a percentagem de religiosidade”. De qualquer das formas e feitas todas estas ressalvas, se só quisermos agrupar todos os que não têm uma religião (seja lá o que esse grupo significar) podemos utilizar esta definição.

Continuando a ler o trabalho, ao chegar aos métodos, não posso deixar passar um erro que merece ser corrigido.

O Human Development Index (HDI) é calculado através de uma fórmula que inclui os seguintes índices:

(Clicar na imagem para aumentar)

Sem entrar em qualquer pormenor matemático, reparemos que no índice já está contabilizada taxa de literacia (LR) que é exactamente a mesma utilizada pelo autor mas sobre o nome de Taxa de Alfabetização. Não é de espantar que a correlação encontrada numa se manifeste na outra, é redundante. Estamos a analisar a mesma variável mais ou menos directamente, mas ela está sempre lá. O Mesmo se passa com a Mortalidade Infantil versos HDI. Neste mesmo índice também consta a Esperança de vida (representado por LE) mas como se sabe este índice está muito dependente da Mortalidade Infantil e é por isso que seria mais útil, para não se correr nenhum risco, que se utilizasse a Esperança de vida aos 5 anos. Desta forma excluiríamos a influência de um índice no outro, como nada disto foi feito outra redundância foi somada à análise.

A única coisa que se pode estranhar é o facto de o Produto Nacional Bruto (PIB = GDP em inglês) per capita não apresentar correlações semelhantes já que também faz parte do HDI. Mas só se estranha enquanto não soubermos que o GDP que é utilizado na formula de cálculo do HDI tem lá um parênteses com PPP escrito, que quer dizer em inglês Purchasing Power Parity ou seja é a nossa Paridade do Poder de Compra (PPC) e que é diferente do GDP per capita. Logo não existe aqui nenhuma duplicação de correlações e por isso é que a correlação entre religiosidade com o GDP pode aparecer sem correlação significativa.

Outro factor que é apresentado e convêm prestar alguma atenção é o valor de R2 . Este coeficiente de determinação representa a proporção da variabilidade nos dados que se pode atribuir ao modelo estatístico testado. Este coeficiente varia entre 0 e 1 e quanto mais próximo de 1 melhor, já que, se tivermos um valor de R2= 0,9 podemos dizer que 90% da variância de Y pode ser atribuída a X. Neste caso o nosso X é a Irreligiosidade e os nossos Y são todos os outros índices. Reparemos que o valor mais alto que temos é 0,179 o que quer dizer que as variações nas percentagens de Irreligiosidade têm uma influência (que pode até nem ser exclusiva) de 18% na percentagem de alfabetos de um país. Ou seja a percentagem de religiosos de um país apenas é (possivelmente) responsável por 18% das variações nas taxas de alfabetização, e nem é liquido o que causa o quê. Todos os outros valores de R2 são ainda menores sendo a maioria deles muito próximos de zero. Se realmente a religião fosse algo de tremendamente negativo para a “bondade” de um país então isso talvez se pudesse verificar num elevado valor de R2 entre Irreligiosidade/homicídios ou Irreligiosidade/Produção científica. O R2 nesta ultima correlação é deveres interessante já que aparentemente parece sugerir que a produção científica de um pais em nada é influenciada pela percentagem de não religiosos pois o R2 = 0. E era este um dos argumentos que recorrentemente aparece quando leio artigos de opinião ou livros a defenderem o fim das religiões. Defendem que as religiões criam sociedades onde se estabelece um clima de respeito pelo irracional e pelos dogmas (verdades indiscutíveis) e torna as sociedades menos interessadas em Ciência, o que pode ter implicações no desenvolvimento e bem-estar do povo. Curiosamente sempre foi um argumento que eu, até certo ponto, aceitava mas aparentemente nem isto se verifica com os dados disponíveis.

Ainda outro ponto na metodologia que pode influenciar os resultados é se os dados são relativamente comparáveis no tempo e na forma de amostragem. Isto é, se as taxas de irreligiosidade não foram medidas aproximadamente na mesma altura que todas as outras (pelo que pude verificar não foram) então estamos a comparar percentagens recolhidas em alturas diferentes e pouco ou nada podemos dizer. Ainda assim, não me parece que as diferenças de poucos anos que existem entre as recolhas dos índices utilizados sejam suficientes para ferir de morte as conclusões apresentadas. O que pode ter uma influência maior nos resultados encontrados é a metodologia utilizada para recolher cada um dos índices. Se uns foram recolhidos através de questionários de rua, outros por chamada telefónica e outros ainda correspondem a censos nacionais então estamos mais uma vez a lidar com amostragens que podem conter vieses diferentes.

É comum criticar-se algumas análises estatísticas onde a recolha que é feita distorce as extrapolações que queremos retirar… e percebe-se porquê. Se, por exemplo, perguntarmos por telefone, durante o nosso horário de trabalho, a mil pessoas em que partidos vão votar não estamos a recolher uma amostragem que seja uma boa aproximação da população portuguesa que vota. Porquê? Porque a amostragem foi feita durante o normal horário de trabalho onde temos maior tendência de encontrar pessoas que não trabalham fora de casa a essa hora. O que fizemos foi distorcer a amostragem onde os desempregados, reformados, domésticas e jovens se encontram sobre-representados (já que são estes que têm maior tendência para se encontrarem em casa e atenderem o telefone). Desta forma a nossa amostra não irá representar a população que irá votar pois contem um viés ou distorção associada. Existem formas de minimizar estes vieses e para facilitar a análise assumirei que todas as fontes que forneceram os dados são competentes para o fazer. Mas existem sempre vieses, que podem ser negligenciáveis dentro de cada recolha de dados mas se somados numa meta-analise como esta podem influenciar as correlações efectuadas. Assim, gostaria apenas de alertar para mais este perigo, já que as fontes utilizadas foram muitas e as metodologias de amostragem foram seguramente diversas. Um escrutínio mais aprofundado poderia, por uma questão de segurança, por de parte alguns países do estudo. Apesar de ter tentado, não me dediquei a esse escrutínio e desta forma estou só a alertar para outros possíveis erros associados. A título de exemplo a maioria os dados de Irrreligiosidade de 54 países retirados da Wikipedia baseiam-se num estudo cuja fonte é um link em japonês.

Dito isto, não quero deixar de tecer um forte elogio a este meu mestre por ter tido a honestidade de não se ficar por palavras e intenções e tentar rebater através de dados palpáveis um dos cinco argumentos que aqui apresentei no post “Acabar com a religião? Por que não.” De facto, não sei se ele o leu, mas o que posso constatar é que pelo menos tentou, casualmente ou não, refutar que “Existe correlação entre religiosidade e uma sociedade melhor” corroborando (ainda que parcialmente) o ponto 2 do meu post onde defendi que é necessário provar que “A existência da Religião tem mais efeitos negativos do que positivos na humanidade.” Não vejo como se pode defender um mundo totalmente secular sem se provar esta ultima afirmação. Se de facto não existe qualquer correlação entre religiosidade e uma sociedade melhor/pior então como podemos dizer que um mundo sem religião é melhor que com ela?

Claro que o facto de não existir correlação (e para este efeito) nem causalidade nada nos diz sobre se devemos ou não defender um mundo sem religiões. Não haver correlação (nem causalidade) apenas nos diz que a religiosidade de um povo não influencia a sua bondade (seja lá a forma com que meçamos a “bondade de um povo” ou uma “sociedade melhor”). E se, a religiosidade, é irrelevante para melhorarmos ou piorarmos uma sociedade então porque deveríamos tentar acabar com ela? Quanto muito a religiosidade seria como o gosto por desporto.

Deixem-me explicar.
Em principio gostar de desporto ou não ligar nenhuma a desporto nenhum não deve ter qualquer correlação com os “Homicídios”, “Desenvolvimento Humano”, “Produção científica”, “PIB per capita”, “Mortalidade Infantil” ou “Taxa de Alfabetização”. Já agora, seria interessante testar estas correlações. Mas se, como espero, não existir nenhuma correlação significativa entre estes factores que devemos fazer? Devemos defender que no mundo só cabem as coisas que contribuem de forma estatisticamente significativa para uma “sociedade melhor”? Ou se existem algumas coisas que são neutras então cada um faça o que quiser e deve haver liberdade total para cada um escolher ser adepto de um clube desportivo ou não ligar patavina a desporto algum? E se isto é válido para tudo o que é neutro nas suas correlações para com uma “sociedade melhor”, como o é gostar de futebol, então por que razão já não é isso válido quando o tema é a religiosidade?

Entrando agora nas duas conclusões do trabalho constatamos que a primeira diz não existir “correlação significativa entre irreligiosidade e taxa de homicídios, produção científica, e PIB nominal per capita.”. Se não há nenhuma correlação estatisticamente significativa, então não podemos afirmar que por termos um país com mais crentes que a Albânia, a China ou a Espanha, vamos ter mais ou menos homicídios, artigos científicos ou vamos ser menos produtivos. Neste ponto parece que o trabalho não é conclusivo e se não o é não ajuda em nada a provar o ponto dois acima apresentado quando se defende o fim da religião. Nestes três índices parece que estamos de acordo.
Parece, mas não estamos, já que estou convencido que podemos encontrar não só correlações estatísticas como explicações causais para existirem menos tendência para homicídios em pessoas crentes do que nas ateias. No entanto isto é uma opinião minha que teria de ser comprovada. Até lá só posso transmitir que me parece lógico que, numa sociedade onde toda a gente acorda ao domingo de manhã bem cedo para ir ouvir “Não matarás” e “Ama o teu próximo”, onde todos cumprimentam o estranho que está ao seu lado e reflectem sofre os seus erros prometendo publicamente corrigi-los, existirá menos crime e violência do que numa outra onde todos são deixados aos seus critérios. Não é, sem dúvida, o único factor que influencia mas de certo que deve pesar. Lá por a terra se não deixar salgar não quer dizer que o sal não deva ser atirado sobre ela. Grande Vieira que já o pregava aos peixes.

Que devemos então dizer sobre a segunda conclusão do trabalho? “Existe correlação significativa entre irreligiosidade e índice de desenvolvimento humano (0,31), Mortalidade Infantil (-0,367), e alfabetização (0,423).” Poder-se-ia resumi-la dizendo que a análise efectuada demonstra uma correlação significativa entre a irreligiosidade e o índice de desenvolvimento humano. As outras duas correlações já se encontram reflectidas na primeira. Ainda assim é necessário despistar muitos outros factores que me parecem, esses sim, verdadeiramente correlacionados com a “infelicidade” e “maldade” no mundo.

Não terá uma real influência causal a fome? a miséria? a desigualdade? a falta de justiça? de liberdade? o facto de as fronteiras tantas vezes não corresponderem às fronteiras de coração e de identidade? Não terão estes factores um peso decisivo sobre a estabilidade, desenvolvimento e prosperidade de um país? E será que ao dizermos que “uma sociedade com maior número de irreligiosos (termo geral que inclui ateus, agnósticos, deístas, cépticos, livre pensadores, humanistas seculares, ou heréticos) apresenta melhores índices médios de desenvolvimento humano(…)” estamos de facto a descobrir algo de novo? Ou uma sociedade com uma maior igualdade entre número de ateus, agnósticos, deístas, cépticos, livre pensadores, humanistas seculares, heréticos e (já agora) religiosos, é uma sociedade mais livre e plural onde todos temos lugar e onde cada um, pensando pela sua cabeça, poderá realizar-se como se sentir mais feliz? Não será tudo isto verdade?

Talvez nada disto possa ser medido de forma racional e objectiva sem uma aproximação demasiado simplista e se torne impraticável podermos chegar a conclusões de causalidade entre os diversos factores. Ainda assim podemos tentar e gostaria de deixar algumas sugestões de análises futuras. Assim, falta testar:

  1. Correlação entre as diferentes religiões e sociedade melhor (suspeito que umas correlações são positivas e outras negativas).

  1. Correlação entre sociedades desiguais e sociedade melhor (aposto que aqui teremos uma real correlação = causalidade).

  1. Correlação dentro de cada sociedade (e.g. entre cidades menos e mais religiosas)

  1. Diferenças dentro de cada país entre ateus e religiosos no que diz respeito às correlações testadas pelo Octávio e no que diz respeito às propostas aqui.

  1. Diferenças entre cada indivíduo (tentado medir as diferenças nos contributos individuais para uma “sociedade melhor” entre quem era ateu e se converteu versus quem era crente e perdeu a fé).

  1. Diferenças nos índices ao longo do tempo dentro de cada país (entre países que foram regidos com separação da Igreja e do Estado e passaram a ser regidos sem haver qualquer separação, e vice-versa).

  1. Repetir todas as análises mas substituir irreligiosidade por ateísmo (definido como a convicção íntima da não existência de nenhuma forma de Deus) e/ou por ateísmo militante (definido como o ateísmo mas defendendo ainda a luta, armada ou não, para destruição e desaparecimento de todas as formas de religião).

Finalmente, e ainda se tudo o que disse estiver errado e tudo o que o Octávio disse estiver certo, apenas podemos concluir (com base na análise efectuada) que os efeitos actuais das pessoas religiosas no mundo são prejudiciais para os índices em causa nas circunstâncias actuais. Mais nada. Nada nos diz sobre o passado e sobre o futuro, assim como nada podemos extrapolar sobre se essas pessoas que se assumem religiosas estiverem em minoria ou se desaparecerem. Como não existem países assim, nada podemos dizer. E todos os outros restantes pontos que apresentei no meu post do ano passado ficam ainda por rebater. Assim, as ultimas linhas desse post podem ser repetidas aqui, um ano depois, com uma estranha actualidade e (quase) sem alterações:

“Agora, no que diz respeito a um mundo sem Religião não vejo (da parte de quem deseja fervorosamente viver num mundo ateu) provas [quase] nenhumas de nada disto, vejo apenas meros palpites baseados em: suposições, especulações, convicção pessoal, desejos impulsivos, experiências individuais... Bom, resumindo: pura fé...

…e é aí que os meus caros amigos ateus militantes não estão em muito melhor posição que os fundamentalistas religiosos ao afirmarem (sem o demonstrar) que um mundo como eles o imaginam seria muito melhor para todos, só revelam menos coragem ao ponto de não se fazerem explodir pelo que acreditam.”


Agradeço profundamente a Octávio Mateus por ter tido a paciência de ler e comentar com muita pertinência as minhas humildes observações aqui expostas.

Agradeço ainda todas as outras pessoas que me deram os seus comentários de diversas formas.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Parabéns Darwin.

Sem duvida a personagem histórica que mais influenciou a minha paixão pela ciência e o amor pela descoberta de muitos outros jovens cientistas.

Honesto e brilhante. Um exemplo e um cérebro.

Talvez o pensador que despoletou a maior mudança no mundo da ciência. Uma nova e bela visão da natureza, completa e cheia de maravilhas.

Muitas são as iniciativas que, em todo o mundo, celebram este dia e como é estranho que no nosso país ninguém tenha dado pela falta da comemoração desta data (?).

Presto então, a este gigante do mundo moderno, a minha humilde homenagem.

199 anos depois do seu nascimento a 12 de Fevereiro (no mesmo dia e ano que Abraham Lincoln) aqui fica talvez a mais vezes citada passagem da Origem das Espécies. As ultimas linhas desta magnifica obra resumem bem a visão que Charles Darwin tinha do mundo. Um mundo belo misterioso e admirável.

«There is grandeur in this view of life, with its several powers, having been originally breathed into a few forms or into one; and that, whilst this planet has gone cycling on according to the fixed law of gravity, from so simple a beginning endless forms most beautiful and most wonderful have been, and are being, evolved.»

Obrigado Darwin!


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

400 anos depois um obrigado a Vieira.

Entrando pois na questão, se o mundo é mais digno de riso ou de pranto; e se à vista do mesmo mundo tem mais razão quem ri, como ria Demócrito, ou quem chora, como chorava Heraclito: eu, para defender, como sou obrigado, a parte do pranto, confessarei uma cousa e direi outra. Confesso, que a primeira propriedade do racional é o risível: e digo, que a maior impropriedade da razão é o riso. O riso é o final do racional, o pranto é o uso da razão. Para confirmação desta, que julgo evidência, não quero mais prova que o mesmo mundo, nem menor prova que o mundo todo. Quem conhece verdadeiramente o mundo, precisamente há-de chorar; e quem ri, ou não chora, não o conhece.

Que é este mundo, senão um mapa universal de misérias, de trabalhos, de perigos, de desgraças, de mortes? E à vista de um teatro imenso, tão trágico, tão funesto, tão lamentável, aonde cada reino, cada cidade e cada casa contìnuamente mudam a cena, aonde cada Sol que nasce é um cometa, cada dia que passa um estrago, cada hora e cada instante mil infortúnios; que homem haverá (se acaso é homem) que não chore? Se não chora, mostra que não é racional; e se ri, mostra que também são risíveis as feras. Mas se Demócrito era um homem tão grande entre os homens e um filósofo tão sábio e se não só via este mundo, mas tantos mundos, como ria? Poderá dizer-se que ele ria, não deste nosso mundo, mas daqueles seus mundos. E com razão; porque a matéria de que eram compostos os seus mundos imaginados, toda era de riso. É certo, porém, que ele ria neste mundo e que se ria deste mundo. Como pois se ria ou podia rir-se Demócrito do mesmo mundo e das mesmas cousas, que via e chorava Heraclito?

A mim, Senhores, me parece, que Demócrito não ria, mas que Demócrito e Heraclito ambos choravam, cada um ao seu modo. Que Demócrito não risse, eu o provo. Demócrito ria sempre: logo nunca ria. A consequência parece difícil e é evidente.
O riso, como dizem todos os filósofos, nasce da novidade e da admiração e cessando a novidade ou a admiração, cessa também o riso; e como Demócrito se ria dos ordinários desconcertos do mundo, e o que é ordinário e se vê sempre não pode causar admiração nem novidade; segue-se que nunca ria, rindo sempre, pois não havia matéria que motivasse o riso. Nem se pode dizer que Demócrito se incitava a rir de alguma cousa que visse ou encontrasse de novo; porque sempre e em todo o lugar ria, e quando saía de casa já saía rindo; logo ria do que já sabia, logo ria sem novidade nem admiração; logo o que nele parecia riso não era riso. Confirma-se mais esta verdade com o motivo e intenção de Demócrito; porque não pode haver riso que se não origine de causa que agrade: tudo o de que Demócrito se ria, não só lhe desagradava muito, mas queria mostrar que lhe desagradava; logo não se ria; e se não ria, que era o que fazia, a que todos chamavam riso? Já disse que era pranto e que Demócrito chorava, mas por outro modo. Ora vede.

Há chorar com lágrimas, chorar sem lágrimas e chorar com riso: chorar com lágrimas é 166 sinal de dor moderada; chorar sem lágrimas é sinal de maior dor; e chorar com riso é sinal de dor suma e excessiva. Para prova da primeira e segunda diferença de chorar com lágrimas, ou sem elas, é notável o exemplo, que refere Heródoto de Psamnito, rei do Egipto. Perdendo Psamnito o reino, viu em primeiro lugar suas filhas vestidas como escravas e não chorou, viu depois seu filho primogénito descalço e carregado de ferros com as mãos atadas e um freio na boca e não chorou; e vendo este mesmo Psamnito e com o mesmo coração, que um seu antigo criado pedia esmola, derramou infinitas lágrimas. Oh grande rei e grande intérprete da natureza! Chora com lágrimas a miséria do criado e sem lágrimas a desgraça dos filhos; assim respondeu ele à pergunta de Cambises: Domestica mala graviora sunt, quam ut lacrimas recipiant. Com o mesmo pensamento, não menos régio, nem menos varonil, Hécuba, com a coroa perdida e a pátria abrasada, proibiu as lágrimas às damas de Tróia, dizendo-lhes assim:

Quid effuso genas fletu rigatis? Levita perpessae sumus, si flenda patimur.


A dor moderada solta as lágrimas, a grande as enxuga, as congela e as seca. Dor que pode sair
pelos olhos, não é grande dor; por isso não chorava Demócrito; e como era pequena demonstração da sua dor não só chorar com lágrimas, mas ainda sem elas, para declarar-se com o sinal maior, sempre se ria. Nada digo que seja contrário aos princípios da verdadeira filosofia e da experiência. A mesma causa, quando é moderada e quando é excessiva, produz efeitos contrários: a luz moderada faz ver, a excessiva faz cegar; a dor, que não é excessiva, rompe em vozes, a excessiva emudece. Desta sorte a tristeza, se é moderada, faz chorar; se é excessiva, pode fazer rir; no seu contrário temos o exemplo: a alegria excessiva faz chorar e não só desta as lágrimas dos corações delicados e brandos, mas ainda dos fortes e duros. Quando Minúcio, livre do cativeiro, apareceu ao seu exército, que era o romano:

In laetitiam tota castra effusa sunt, ut praegaudio militibus omnibus lacrimae
manarent, diz Plutarco.

Pois se a excessiva alegria é causa do pranto, a excessiva tristeza porque não será causa do riso? A ironia tem contrária significação do que soa; o riso de Demócrito era ironia do pranto; ria, mas irònicamente, porque o seu riso era nascido de tristeza, e também a significava; eram lágrimas transformadas em riso por metamorfoses da dor; era riso, mas com lágrimas, como aquele de quem disse Estácio:

Lacrimosos impia risus audiit.

Na guerra morrem muitos soldados rindo; e a razão é, diz Aristóteles, porque são feridos no
diafragma. Não ria Demócrito como contente, ria como ferido: recebia dentro do peito todos
os golpes do mundo e tão malferido ria. Os olhos com injustiça se poderão queixar desta minha filosofia: o pranto chamava-se assim, porque se batiam as mãos uma com a outra, quando se chorava; porque para chorar não são precisos os olhos, e não seria próvida a natureza se, havendo sido a origem de tantos pesares, lhes desse um só desafogo; e se choram as mãos, a
boca porque não há-de chorar? Heraclito chorava com os olhos, Demócrito chorava com a boca; o pranto dos olhos é mais fino, o da boca é mais mordaz; e este era o pranto de Demócrito.
De sorte, que na minha consideração, não só Heraclito, mas Demócrito chorava, só com a diferença, de que o pranto de Heraclito era mais natural, o pranto de Demócrito mais esquisito; e
tudo merece este mundo, digno de novos e esquisitos prantos, para ser bastantemente chorado.
Mas porque esta minha suposição me separa do problema e pode parecer, que, como muitas vezes sucede, me aparte da opinião comum para fugir da dificuldade: seja embora o riso de Demócrito verdadeiro e próprio riso, apareçam 167 em juízo um e outro filósofo, para que ouvidos ambos, se veja claramente a razão de cada um, e confio do merecimento da causa que será tão justa a sentença, que Demócrito saia chorando, e Heraclito rindo.
Séneca, no livro De Tranquillitate, falando destes dous filósofos, dá a razão por que sempre ria
um e chorava outro, com estas judiciosas palavras:

Hic, quoties in publicam processerat, flebat, ille ridebat: huic omnia, quae agimus, miseriae, illi ineptiae videbantur.

Demócrito ria, porque todas as cousas humanas lhe pareciam ignorâncias; Heraclito chorava, porque todas lhe pareciam misérias: logo maior razão tinha Heraclito de chorar, que Demócrito de rir; porque neste mundo há muitas misérias que não são ignorâncias, e não há ignorância que não seja miséria.