terça-feira, 20 de novembro de 2007

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

O Lar de Herculano...

Sua Majestade Imperial visitou o Sr. Alexandre Herculano. O facto em si é inteiramente incontestável. Todos sobre ele estão acordes, e a História tranquila. No que porém as opiniões radicalmente divergem é acerca do lugar em que se realizou a visita do Imperador brasileiro ao historiador português.
O Diário de Notícias diz que o Imperador foi à mansão do Sr. Herculano. O Diário Popular, ao contrário, afirma que o Imperador foi ao retiro do homem eminente que... O Sr. Silva Túlio, porém, declara que o Imperador foi ao tugúrio de Herculano; (ainda que linhas depois se contradiz, confessando que o Imperador esteve realmente na tebaida do ilustre historiador que...).
Uma correspondência para um jornal do Porto afiança que o Imperador foi ao aprisco do grande, etc. Outra vem todavia que sustenta que o Imperador foi ao abrigo desse que... Alguns jornais de Lisboa, por seu turno, ensinam que Sua Majestade foi ao albergue daquele que... Outros, contudo, sustentam que Sua Majestade foi à solidão do eminente vulto que... E um último mantém que o imperante foi ao exílio do venerando cidadão que...
Ora, no meio disto, uma coisa terrível se nos afigura: é que Sua Majestade se esqueceu de ir simplesmente a casa do Sr. Alexandre Herculano!

Eça de Queirós

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Random Evolution.

Um dos maiores erros que se cometem ao falar de evolução dos seres vivos reside numa pequena confusão entre conceitos.
São já incontáveis as vezes com que me deparei com o seguinte comentário:

"Se a evolução se deve ao acaso então estamos todos aqui por pura sorte? Foi uma sorte do caraças, não foi?"

A resposta é não e sim . Depende da definição de acaso. Não estamos aqui por mero acaso mas sim, foi uma sorte dos diabos estarmos todos aqui.

O resultado de milhões de anos de evolução (ou seja, todos os seres vivos actualmente existentes) não se deve seguramente só ao acaso, mas podemos dizer com igual segurança, que foi uma sorte descomunal chegarmos aqui e sermos como somos.

Porquê?

Se esquecermos outros processos evolutivos e aceitarmos que a Evolução é impulsionada essencialmente pela selecção natural, então ficamos com um mecanismo que nada tem de aleatório. O próprio termo ajuda a percebê-lo, "selecção" implica uma escolha que raramente é aleatória. O que espanta é que esta seja "natural", ou seja, não necessitar de ser dirigida. É a própria Natureza que selecciona quem sobrevive ou deixa mais descendentes.

A confusão a que me referia deve-se ao facto de a variabilidade que é seleccionada ser não dirigida e não aleatória. Aliás, mais do que não ser aleatória, existem limites e restrições para as diferentes formas que a variabilidade pode assumir. Nunca iremos ver uma ave a deslocar-se com um motor a jacto, por mais útil que isso pudesse ser. Simplesmente não existem mutações nem nenhum caminho evolutivo viável que leve uma ave a alterar-se de forma a desenvolver naturalmente todas as peças de um motor a jacto no seu corpo.

Assim a variabilidade natural - o material que alimenta as "escolhas" da selecção natural - restringe-se aos limites impostos pela constituição do genoma dos seres vivos e não é dirigida com nenhuma finalidade. É só nestes termos que os biólogos se referem à aleatoriedade da variação existente na Natureza. Nem todas as variações tem igual probabilidade de surgir e nem todas têm as mesmas hipóteses de se fixar nas populações, são de facto imprevisíveis mas não são "ao acaso". Longe disso.

E quanto ao facto de estarmos aqui todos da forma como estamos?...

Apenas o devemos às circunstâncias ambientais que conduziram a selecção natural a seleccionar todas as nossas características físicas. Ou seja, devemos a nossa existência às contingências do nosso passado evolutivo. O acaso deu uma ajuda até aqui, mas foi uma selecção muito rigorosa que nos moldou.

Foi uma sorte sermos moldados nesta forma, caso contrário que acaso poderia levar-me a escrever desta forma?